Nosema



Um dos agentes infeciosos mais recentes da abelha europeia é a Nosema ceranae, provocando uma doença conhecida como nosemose tipo C e que foi identificada na Apis mellifera em 2005. No entanto, testes realizados em amostras anteriores a essa data, revelam que este problema começa a estar presente nas nossas abelhas desde o final da década 90. Trata-se de uma doença que não apresenta sintomas diretos na abelha, o que tona difícil o seu diagnóstico. Ainda assim, provoca alterações na fisiologia e no comportamento das abelhas que têm como consequência modificações no comportamento da colónia, no seu equilíbrio e nos seus níveis de produção, podendo levar à morte.

Ciclo de vida da Nosema ceranae

A infeção das abelhas com os esporos de Nosema ocorre através da boca da abelha adulta. Os esporos alojam-se dentro das células epiteliais do intestino que parasitam metabolicamente e onde se reproduzem. Três dias após a infeção, podem-se observar tantos esporos maduros como esporos vazios dentro das células infetadas (Higes, 2007).

O agente infecioso, Nosema ceranae, multiplica-se da mesma forma que a Nosema apis, embora o seu ciclo de vida ocorra em metade do tempo. Á medida que a infeção vai progredindo os esporos vão sendo libertados no intestino médio, e alguns passam através do intestino delgado para o reto onde se acumulam. Uma abelha operária, altamente infetada pode conter 30 a 50 milhões de esporos. Os esporos são libertados para o exterior através dos excrementos da abelha, e podem permanecer viáveis até um ano nos quadros e de três a quatro meses no mel.

Na colónia

A nosemose apresenta um largo período de incubação assintomático na colmeia, o que pode explicar a ausência de sintomas evidentes antes da morte da colónia. No entanto, alguns investigadores começam a atribuir alterações no comportamento da colónia à infeção, estas normalmente passam despercebidos aos apicultores, como:

- Desaparecimento inexplicável das abelhas adultas;

- A falta de atenção à criação por parte das amas e um anormalmente longo período de criação durante os meses frios (meses quando devia haver uma paragem invernal ou uma diminuição da criação);

- Um alto número de quadros cobertos por criação em relação aos quadros cobertos por abelhas durante os meses quentes;

- Uma diminuição da produção de mel, um ou dois anos antes do colapso da colónia;

- Finalmente, após um período que varia entre 1,5 e 2 anos, as colmeis infetadas estão claramente despovoadas.

A dimensão da população de abelhas numa colónia, para além de outros fatores, depende diretamente da duração de vida das abelhas obreiras, e neste ponto a infeção com N. ceranae é capaz de diminuir a esperança de vida das abelhas, levando a uma diminuição na densidade populacional das colónias infetadas, com consequências negativas para a produção.

As abelhas recolectoras estão mais expostas à infeção com N. ceranae logo sofrem habitualmente um encurtamento na sua esperança média de vida. De facto, com uma alta taxa de mortalidade nas recolectoras, as abelhas não infetadas (maioritariamente amas) podem ser obrigadas a acelerar a sua maturação, fazendo a transição de abelhas de interior para recolectoras numa fase de vida anormalmente precoce, desta forma mantendo o equilíbrio adequado ao desenvolvimento da colónia.

Se juntarmos às consequências anteriores, o facto de as abelhas infetadas terem um maior grau de procura e apetência por alimento, originando uma maior taxa de ingestão de hidratos de carbono, com uma diminuição de trofilaxia nas abelhas que estão infetadas, em comparação com as abelhas livres de infeção, é fácil percebermos que a produção de mel em colónias infetadas assintomáticas, sofre uma importante redução, quando comparadas com colónias tratadas. Além destes efeitos patológicos uma colónia menos povoada apresenta abelhas recolectoras que demonstram menos eficiência nas suas tarefas de visitar e recolha de produtos no ambiente.

Os trabalhos de campo que têm sido realizados, têm confirmado a influência negativa da infestação de Nosema, nas abelhas adultas, no tamanho da população e na quantidade de criação (Botías et al. 2012). Quando a Nosema não é controlada, a infeção provoca uma diminuição significativa na produção de mel.

A nosemose tipo C tem outras consequências para as abelhas, como sejam:

- Incapacidade de boa termorregulação, com preferência significativa por colocar-se nas áreas mais frias da colónia;

- Alterações na capacidade de voo possivelmente relacionadas com a redução dos níveis de hidratos de carbono na hemolinfa das abelhas infetadas;

- Desregulação na produção de uma feromona primária, que é responsável pela regulação do comportamento social e homeostasia da colónia (a modificação nos níveis desta pode alterar a organização da colónia e colocar em perigo o seu desenvolvimento e sobrevivência);

- Diminuição do comportamento higiénico, com perda de efetividade no tratamento da varroose, principalmente nos tratamentos que dependem do contacto das abelhas com o princípio ativo e posterior contacto abelha a abelha para que este chegue até as Varroas.

Transmissão dentro da colmeia

Apesar da nosemose tipo C não mostrar as mesmas marcas fecais típicas da nosemose tipo A, a forma de contaminação do material apícola dentro da colmeia, dá-se da mesma forma, ou seja, por esmagamento das abelhas durante o manuseamento da colmeia ou por defecação de abelhas doentes dentro da colmeia, sendo esta a principal fonte de infeção. Quando as abelhas operárias saudáveis limpam a colmeia ingerem os esporos ou alimentos contaminados, ficando infetadas. Estas contaminações não deixam evidências.

As colmeias infetadas com Nosema ceranae evidenciam uma presença constante de Nosema ao longo do ano. A partir do momento em que se encontrem níveis iniciais ainda baixos de esporos nas abelhas, é boa prática começar a tomar medidas, e não esperar que a colónia consiga lidar com a doença por si só, tal não vai acontecer.

Em relação às taxas de infeção e prevalência da doença, tem sido verificado, que dependendo de algumas variações nas condições climáticas, os níveis de Nosema também variam de ano para ano.

No que se refere à intensidade de infeção em cada estação do ano, estudos realizados em climas temperados sugerem que a quantidade de abelhas infetadas na colónia pode ser maior nos meses de primavera. Embora as épocas em que a colónia colapsa sejam, a parte final do verão e início do outono ou no final do inverno e início da primavera. Sendo o carácter da infeção diferente nestas duas épocas. Durante o colapso na estação fria, a maioria das abelhas estão infetadas, e a contagem de esporos ultrapassa os 10 milhões de esporos por abelha. Por outro lado, no colapso do final da estação quente, as abelhas que estão infetadas na colmeia são menos de metade, e a contagem de esporos é geralmente muito menor. No verão as abelhas campeiras vão morrendo no campo levando a um enfraquecimento da colónia de forma gradual sem apresentar sintomas. Já no inverno as condições do meio nem sempre permitem a atividade das abelhas, o que leva a uma maior propagação da doença dentro da colmeia por simples proximidade; nesta época as colónias não tratadas morrem ficando um grande número de abelhas mortas dentro da colmeia.

A transmissão entre colmeias

A disseminação da Nosema entre colónias pode ocorrer de várias formas:

- Através da transferência de quadros contaminados entre colmeias;

- Pela alimentação das colmeias com mel contaminado;

- Pela divisão ou junção de colmeias contaminadas;

- Por pilhagem de mel das colmeias infetadas ou por deriva;

- Por introdução de pacotes com abelhas infetadas, e/ou rainhas infetadas;

- Por maneio e inspeção descuidados das colmeias.

Após termos algumas colmeias com Nosema, é muito fácil as restantes acabarem contaminadas. Daí ser importante fazer tratamentos preventivos e tratamentos logo no aparecimento dos primeiros sintomas ou amostras positivas.